Tarefas de Aula - Reflexão sobre o filme "O Amor é Cego"


Ficha Técnica


Título original:Shallow Hal
Gênero:Comédia
Duração:1 hr 53 min
Ano de lançamento: 2001
Site oficial: http://www.shallowhalmovie.com/
Estúdio: 20th Century Fox / Conundrum Entertainment
Distribuidora: 20th Century Fox Film Corporation
Direção: Peter Farrelly, Bobby Farrelly
Roteiro: Sean Moynihan, Peter Farrelly e Bobby Farrelly
Produção: Bobby Farrelly, Peter Farrelly, Bradley Thomas e Charles B. Wessler




A comédia Shallow Hal, dos irmãos Farrelly, não nos possibilita apenas a diversão e o entretenimento ou, como muitos dos comentários que li na internet, se limita a falar de sentimentos como o amor e a contar piadas grosseiras e exageradas sobre as características físicas das pessoas. Independente de gostar ou não do filme, das interpretações dos atores ou de sua qualidade cinematográfica, é possível perceber que ele pode contribuir para a reflexão e discussão sobre temas interessantes, cotidianos e atuais em nossa sociedade. Dentre estes estão a existência e a imposição de estereótipos de beleza, a auto-estima individual, a superficialidade das relações, saúde e pessoas com deficiência.

O filme conta a história de um homem, Hal (Jack Black), que a partir de um conselho do pai, prestes a morrer, passa a se relacionar somente com mulheres fisicamente bonitas, atraentes e perfeitas. Tudo se transforma quando ele se encontra com um famoso guru, Anthony Robbins, que o hipnotiza sem que ele saiba. A partir daí, Hal passa a ver além da aparência física das mulheres, ele agora vê a beleza interior se refletindo nas características físicas delas. Por isso se engana ao achar lindas, mulheres que muitas vezes não são. Diante de tal situação ele conhece Rosemary (Gwyneth Paltrow), filha de seu chefe, uma mulher obesa pela qual ele se apaixona e com quem começa a namorar, mas a vê com uma aparência de super modelo. Com a ajuda de seu amigo Mauricio (Jason Alexander) ele sai do efeito da hipnose e passa a ver todas as pessoas que conheceu durante esse período, inclusive Rosemary, como elas realmente são fisicamente e após o choque tenta decidir se irá continuar seu relacionamento com Rosemary ou não.

O título do filme em inglês evidencia a superficialidade da personagem principal, Hal, diante de seus relacionamentos. Em português, o título adotado é a famosa expressão metafórica “O Amor é Cego” utilizada para se referir ao sentimento que pode transformar o ser humano, segundo ela, capaz até de que ele não consiga ver os fato como eles são, capaz de cegar o indivíduo e de alterar a sua visão da realidade. Ora, já podemos identificar aí a primeira referência à deficiência. A cegueira é tratada no filme de forma metafórica diante da hipnose de Hal.

O padrão de beleza identificado em O Amor é Cego a partir da descrição do pai de Hal e
das atrizes participantes é exatamente o da nossa sociedade brasileira e ocidental. As lindas mulheres são as jovens, sem deformidades físicas e magras, por exemplo. Esse estereótipo é intensamente estimulado e reproduzido pela propaganda e pela mídia. Assim, cada vez mais as pessoas tentam se adequar a ele, passando por cima de como realmente são, criando expectativas, culpas e medos que afetam a auto-estima e as relações interpessoais. Caso a preocupação nessas relações seja primordialmente a aparência física, muitas vezes deixa-se de lado a intimidade, a criação de vínculos, a preocupação com o outro e o respeito. Diante disso, as relações se tronam superficiais e imediatistas.

Ao longo da trama podemos identificar determinadas características físicas que chamam
atenção em muitas personagens. São-nos apresentadas diferenças físicas adquiridas ao longo da vida ou congênitas que muitas vezes afetam significativamente o cotidiano causando medos, constrangimentos e tronando essas pessoas até mesmo vítimas de preconceito.

Em o Amor é Cego vemos crianças com partes do corpo deformadas devido a queimaduras; uma mulher com um dos dedos do pé maior do que os outros; a personagem Ralph, ex-namorado de Rosemary (Gwyneth Paltrow) com a doença de pele psoríase; Mauricio (Jason Alexander) com uma deformidade congênita que o fez apresentar um vestígio de cauda/ rabo, pois sua coluna é mais comprida do que o normal; Rosemary (Gwyneth Paltrow) com o grave problema de saúde que é a obesidade e Walt ( Rene Kirby) que sofre de Espinha Bífida.
Não é apenas no filme que os problemas, alterações, deficiências ou apenas diferenças, como quer que se diga, aparecem. Eles estão presentes a todo o momento, seja conosco ou a nossa volta, mesmo que isso não seja muito aparente ou fácil de identificar. Dentre os problemas que mencionei, é interessante analisar como o filme trata da obesidade e da Espinha Bífida.
Rosemary (Gwyneth Paltrow) e sua mãe apresentam obesidade, uma doença comum em nossa sociedade. O Amor é Cego nos mostra uma das causas dessa doença e as dificuldades que enfrentam as pessoas obesas. A alimentação da namorada de Hal (Jack Black) é completamente desregrada e exagerada e ela não parece praticar atividades físicas com frequência. Ela consome muitos alimentos ricos em açúcar e gorduras e sempre em grandes quantidades, como sorvete, Milk-shake, hambúrguer, queijo, batata frita e chocolate. Além disso, a personagem, por mais de uma vez, cai no chão em locais públicos devido ao seu peso não ser sustentado pela cadeira onde estava sentada, um enorme constrangimento.Rosemary se mostra ainda incomodada com roupas curtas, pois evidenciam seu grande tamanho.
Diante de tudo isso, percebemos que é necessário cadeiras especiais que sejam mais reforçada e roupas com tamanhos maiores, por exemplo, para atender a essas pessoas, ou seja, materiais, objetos e serviços especiais. É interessante notar também a postura de Rosemary (Gwyneth Paltrow). Ela fica constrangida no restaurante, quando percebe a quantidade de comida que come e demonstra em suas conversas com Hal (Jack Black) uma baixa auto-estima devido a sua aparência.
Quanto ao problema de Espinha Bífida, ele nos é mostrado com a personagem Walt interpretado pelo ator Rene kirby que tem tal má formação. Segundo a psicóloga Ana Helena Rotta Soares, do Instituto Fernandes Figueira (IFF),a espinha bífida:
“...está entre as mais graves malformações congênitas compatíveis com a vida, além de ser a malformação anatômica do Sistema Nervoso Central mais freqüente em pediatria. Trata-se de um defeito congênito caracterizado por formação incompleta da medula espinhal e das estruturas que protegem a medula. O defeito ocorre no primeiro mês de gravidez e engloba uma série de tipos de malformações.
A doença está associada, ainda, a vários níveis de alterações neurológicas, deformidade e alteração de sensibilidade dos membros inferiores, alteração da bexiga com perda ou retenção da urina e alteração no funcionamento do intestino. Contudo, diversos estudos comprovam que as habilidades intelectuais dos portadores da doença se encontram dentro da normalidade. “ [1]
Se compararmos a postura e auto-estima das personagens Walt (Rene Kirby) e Rosemary (Gwyneth Paltrow) identificamos uma enorme diferença. O primeiro demonstra ser mais seguro mesmo diante das dificuldades de locomoção, tendo em vista que ele não anda totalmente ereto. Walt (Rene Kirby) é comunicativo e positivo, ao contrário de Rosemary (Gwyneth Paltrow). Ele dança, anda de bicicleta, se encontra com os amigos, conversa, administra sua empresa e “paquera” muitas mulheres. Ainda assim, ele fala sobre suas dificuldades relatando os constantes calos que tem nas juntas dos dedos, parece andar com uma espécie de bota ortopédica e sua bicicleta é adaptada.
Portanto, percebemos que o filme O Amor é Cego pode suscitar reflexões em torno do tema das necessidades especiais. Obesos, deficientes físicos, pessoas com deformidades congênitas, entre tantas outras, podem precisar de adaptações ao seu redor para que tenham uma vida saudável e agradável. Além disso, precisam ser tratadas com respeito para que se sintam parte da sociedade e se tornem agentes. Tal obra cinematográfica nos mostra mais do que o amor de um homem por uma mulher, ele evidencia as dificuldades cotidianas das pessoas com algum tipo de necessidade especial, o preconceito e a falta de acessibilidade. Mostra não só a fluidez e superficialidade das relações interpessoais pautadas na perfeição da aparência física, que é personificada em Hal (Jack Black), mas também ressalta os dilemas individuais, como Maurício (Jason Alexander) , que apresentava dificuldades de relacionamento devido a insegurança que tinha pela sua deformidade física . O filme traz ainda valores como a generosidade quando se destaca o trabalho voluntário, presente em vários momentos da trama e a valorização dos sentimentos construídos ou originados a partir do conhecimento profundo do outro.


[1] Entrevista concedida à Agência Fiocruz de Notícias (AFN) presente no endereço eletrônico http://www.fiocruz.br/ccs/cgi/cgilua.exe/sys/start.htm?from_info_index=121&infoid=1775&sid=3 acessado em 13 de maio de 2011.